Nos prontos-socorros do Brasil e do mundo, uma cena tem se tornado cada vez mais comum: homens e mulheres com menos de 45 anos chegando com dor no peito, falta de ar, suor frio e palpitações — sinais clássicos de infarto agudo do miocárdio. Antes associado quase exclusivamente aos mais velhos, o infarto agora é uma realidade crescente entre adultos jovens. Mas o que mudou?
A resposta envolve uma combinação de fatores que transformaram silenciosamente o estilo de vida de toda uma geração. Nas últimas décadas, obesidade, diabetes tipo 2, hipertensão arterial e colesterol elevado deixaram de ser doenças “da meia-idade”. Hoje, muitos jovens já apresentam alterações metabólicas ainda na adolescência. O excesso de peso e a resistência à insulina iniciam um processo inflamatório que acelera a formação de placas nas artérias coronárias, aumentando o risco de obstruções que levam ao infarto.
A rotina atual favorece o sedentarismo. Os jovens passam horas diante do computador, celular ou videogame e substituem o movimento que antes era parte natural do dia a dia. A redução de atividade física — combinada a dietas ultraprocessadas e ricas em açúcar — cria um cenário ideal para o surgimento precoce de doença cardiovascular.
Embora o consumo de cigarro convencional tenha diminuído, surgiu um novo vilão: o cigarro eletrônico. Enganoso por parecer “moderno” e “menos nocivo”, o vape aumenta inflamação, estresse oxidativo e pode provocar espasmo das artérias. Entre os mais jovens, o uso de maconha, cocaína, ecstasy e anabolizantes também contribui. Essas substâncias são capazes de elevar rapidamente a pressão arterial e desencadear arritmias, trombose e infarto — muitas vezes em indivíduos sem doença cardíaca prévia.
Estresse, ansiedade e noites mal dormidas, questões de saúde mental nunca foram tão presentes entre jovens. Estresse crônico, ansiedade e privação de sono estão diretamente associados à piora da pressão arterial, mudanças hormonais e aumento de inflamação sistêmica. A soma desses fatores cria um ambiente propício para doenças cardíacas.
Há ainda os casos em que a genética pesa. Doenças hereditárias como a hipercolesterolemia familiar, que mantém níveis muito elevados de LDL colesterol desde o nascimento, são subdiagnosticadas. Sem tratamento precoce, jovens com predisposição genética podem desenvolver aterosclerose acelerada.
Poluição urbana e novos mecanismos de infarto, viver em grandes cidades significa conviver com níveis cada vez maiores de poluição. Partículas finas presentes no ar são capazes de penetrar na corrente sanguínea, aumentar inflamação e favorecer a formação de coágulos. Além disso, a medicina passou a reconhecer melhor outras causas de infarto típicas de adultos jovens, como espasmo coronariano e dissecção espontânea das artérias do coração.
O que podemos fazer para mudar esse cenário – a boa notícia é que grande parte desse risco é modificável. Hábitos simples — como abandonar o cigarro e o vape, praticar atividade física regular, manter alimentação equilibrada, controlar o estresse, dormir bem e fazer exames periódicos — podem reduzir drasticamente a probabilidade de um infarto precoce.
Assim, torna-se essencial que os jovens entendam que saúde cardiovascular não é um tema “para depois”. Não adiem, quanto mais cedo começarmos a cuidar do coração, maiores as chances de evitar que essa tendência preocupante continue crescendo. Mudanças agora podem fazer diferença no futuro.
Antonio Carlos Palandri Chagas é Médico e Professor Titular de Cardiologia do Centro Universitário FMABC

