Marcelo Lima é afastado da Prefeitura após operação da Polícia Federal
Ação investiga corrupção e lavagem de dinheiro do prefeito de São Bernardo; presidente da Câmara, Danilo Lima, também foi afastado, e R$ 1,9 milhão foi apreendido
São Bernardo amanheceu nesta quinta-feira (14) sob um abalo político. A Justiça determinou o afastamento, por um ano, do prefeito Marcelo Lima – Podemos, no âmbito da operação “Estafeta”, deflagrada pela Polícia Federal, que investiga um suposto esquema de corrupção e lavagem de dinheiro envolvendo contratos públicos nas áreas de obras, saúde e manutenção. Além disso, a ação culminou na prisão de dois empresários e de um servidor, bem como na apreensão de aproximadamente R$ 1,9 milhão nesta fase, valor que se soma aos R$ 14 milhões localizados no mês passado com um servidor apontado como operador financeiro do prefeito.
De acordo com a Polícia Federal, as investigações tiveram início após a apreensão, em julho, de quase R$ 13 milhões e US$ 157 mil (o equivalente a cerca de R$ 14 milhões) em espécie na posse do servidor público Paulo Iran, auxiliar legislativo na ALESP – Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo e considerado o operador do esquema. Nesse sentido, os investigadores apuram a existência de um fluxo de propina envolvendo fornecedores da prefeitura, com pagamentos direcionados ao prefeito e a pessoas próximas a ele.
Caso
A apreensão milionária que deu origem ao caso aconteceu por acaso. Em 7 de julho, a PF realizava uma operação para prender outro alvo quando abordou Paulo Iran. No carro dele, foram encontrados R$ 583,3 mil. Pouco depois, em uma sala no mesmo prédio, foram localizados R$ 12.278.920,00 e US$ 156.964,00 em espécie. Apesar da descoberta, o servidor não foi preso naquele momento. Ainda assim, a análise do celular dele revelou mensagens e indícios de ligações diretas com o prefeito, incluindo pagamentos de contas pessoais de Marcelo Lima, da esposa e da filha.
Paulo Iran, que também atuava como assessor do deputado estadual Rodrigo Moraes – PL, está foragido desde então, com mandado de prisão expedido pela Justiça. Rodrigo Moraes afirmou, em nota, que determinou a exoneração imediata do servidor assim que soube do caso.
Justiça
A Polícia Federal chegou a pedir a prisão preventiva de Marcelo Lima, porém a Justiça negou o pedido. Contudo, determinou seu afastamento imediato do cargo por um ano, a instalação de tornozeleira eletrônica, proibição de sair de casa à noite e aos finais de semana, restrição de deixar a cidade sem autorização judicial e proibição de manter contato com os demais investigados.
O presidente da Câmara Municipal e primo do prefeito, vereador Danilo Lima – Podemos, também foi afastado das funções públicas por decisão judicial. Outro alvo foi o suplente de vereador Ary José de Oliveira – PRTB, que teve mandado de busca e apreensão cumprido em sua residência.
No Legislativo, a substituição da presidência deve seguir a ordem natural de sucessão, como explica o advogado Dr. Luis Ricardo Davanzo: “Como o afastamento é provisório, temporário, uma medida cautelar, nesse caso quem deve assumir é a vice. Se o presidente foi afastado por decisão judicial, a vice precisa assumir. Se não for assim, para que serve a figura do vice? O vice responde na ausência do presidente”.
Em nota, a vice-presidente da Câmara, vereadora Ana Nice – PT, afirmou que “a cidade não pode ser prejudicada por supostas irregularidades que impactam diretamente a vida de cada cidadã e cidadão são-bernardense. Enquanto vice-presidente da Câmara, reafirmo nosso compromisso de seguir todas as medidas previstas no Regimento Interno, garantindo a estabilidade institucional e o bom funcionamento do Legislativo”, disse.
Vice
Com a saída de Marcelo Lima, a vice-prefeita Jéssica Cormick – Avante, de 38 anos, assume o comando do Executivo municipal. Sargento da Polícia Militar de São Paulo desde 2005, ela se afastou da corporação em 2024 para disputar sua primeira eleição, na chapa encabeçada por Marcelo Lima.
Operação
A operação desta quinta prendeu em flagrante os empresários Edmilson Carvalho, sócio da Terraplanagem Alzira Franco Ltda., e Caio Fabbri, sócio da Quality Medical, empresas que possuem contratos com a prefeitura. Do mesmo modo, foi preso Antonio Rene da Silva, diretor de departamento na Secretaria de Coordenação Governamental da cidade, contra quem já havia mandado de prisão expedido. Nas residências dos detidos, a PF apreendeu grandes quantias em dinheiro em espécie.
Além disso, a operação cumpriu 20 mandados de busca e apreensão, autorizados pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, em São Bernardo, São Paulo, Santo André, Mauá e Diadema. Foram autorizadas também medidas de quebra de sigilos bancário e fiscal, afastamento de investigados de funções públicas e monitoramento eletrônico. Os investigados poderão responder por organização criminosa, lavagem de dinheiro, corrupção passiva e corrupção ativa.
Cautelar
O advogado Dr. Luis Ricardo Davanzo destacou que a medida contra o prefeito não é definitiva: “É importante destacar que se trata de uma medida cautelar, não é uma condenação e nem uma antecipação de pena. Indício não é suficiente para condenação — ele precisa ser corroborado por outras provas. Do ponto de vista processual, o prefeito ainda pode conseguir a revogação dessa medida, seja no próprio juízo que a determinou, seja em instâncias como o STJ ou o STF”.
A Executiva Nacional do Podemos também se manifestou em defesa de Marcelo Lima: “Confiamos na lisura da conduta de Marcelo Lima e acreditamos também ser necessária prudência em relação a todo tipo de manifestação leviana, sem as devidas informações acerca das recentes investigações. Reafirmamos nossa crença na importância de que as apurações devam ocorrer com responsabilidade e respeito às garantias legais”.
A Prefeitura de São Bernardo afirmou, em nota, que irá colaborar com as investigações: “A gestão municipal é a principal interessada para que tudo seja devidamente apurado. Reforçamos que o episódio não afeta os serviços na cidade”.
Por sua vez, Ary José de Oliveira declarou: “Desconheço o motivo de meu nome ter sido citado em matéria jornalística. Logo pela manhã esteve em minha casa um grupo de policiais federais com mandado de busca e apreensão, após inspecionarem a casa toda, documentos e medidas de praxe, nada encontraram. Levaram meu celular para averiguação, para em seguida ser devolvido”.
Desdobramentos
Ainda mais, o andamento das investigações deve se intensificar nas próximas semanas, com análise do material apreendido, movimentações financeiras e quebras de sigilo. Apesar disso, o processo judicial ainda se encontra em fase inicial, e não há previsão para conclusão. Nesse sentido, os desdobramentos podem alterar o prazo de afastamento do prefeito, caso instâncias superiores reavaliem a medida.
MARCOS FIDELIS