Os atos cometidos no dia 8 de janeiro não podem e não serão definidos como atos de vandalismo. Temos claro que se tratou de uma tentativa de golpe de Estado, que é definida como destituição ilegal de um governo legitimamente constituído, podendo ser por meio da força armada ou de ações políticas ou jurídicas manifestamente ilegais.
A tentativa de golpe do último dia 8 de janeiro ainda carece de que nas investigações se chegue aos autores intelectuais e financiadores. Mesmo contando com parte do apoio popular, que seriam alguns militares e simpatizantes do bolsonarismo, um golpe não deixa de ser definido como golpe. O que presenciamos foi algo de extrema gravidade, pois o próprio regime democrático correu riscos.
Alguns tentam firmar tese defensiva aos golpistas, alegando que não deveriam ocorrer punições, pois o golpe não se concretizou. Contudo, a mera tentativa já caracteriza crime contra o regime democrático e por óbvio isso não precisa estar escrito de forma textual na lei e nem em qualquer legislação, pois seria algo absurdo, considerando que caso o golpe fosse exitoso, seria impossível punir os golpistas.
Desta forma, o ato de planejar e executar já caracteriza o cometimento de crime contra o regime democrático, sem prejuízo dos golpistas responderem por mais crimes eventualmente cometidos na tentativa, como depredação de patrimônio público, desacato a autoridades, agressões e até homicídio ou tentativa de homicídio. Vários são os crimes possíveis e passíveis de terem sido cometidos, alguns inclusive envolvendo redes digitais, como fake news e outros.
As instituições se mantiveram firmes e não só reagiram contra o golpe como estão apurando e responsabilizando os responsáveis diretos e indiretos. Foram centenas de prisões de extremistas radicais que deverão, após a definição de suas condutas, responderem por diversos crimes.
As forças policiais que foram leais à democracia agiram contra a verdadeira barbárie que ocorreu com a tentativa de golpe, e o Ministro da Justiça Flávio Dino foi cirúrgico em suas decisões. O STF, por sua vez, guardião da Constituição, manteve-se firme e forte frente a essa tentativa covarde de golpe contra a democracia. Não podemos esquecer o papel importante dos canais de comunicação alinhados com o regime democrático que se posicionaram de forma firme e forte em defesa da democracia. A comunidade Internacional foi majoritária em condenar a tentativa de golpe.
Importante destacar que o modelo adotado foi copiado da tentativa de invasão do Congresso americano por fanáticos ligados ao ex-presidente Donald Trump. Devemos destacar também que as Forças Armadas brasileiras agiram de forma correta e séria, não tomando partido de qualquer ação antidemocrática.
Obviamente, nas Forças Armadas é possível que se apure que esse ou aquele militar, de forma isolada, tenha sido simpático ou até apoiado tal tentativa de golpe, e se existirem, serão punidos pela própria instituição e pela justiça que soube se manter fiel à Constituição Federal.
Após este triste episódio contra nossa recente democracia, creio que a população esteja mais ciente da necessidade dos cuidados a serem adotados com o voto, a fim de evitar que fatos como estes se repitam. Finalizamos afirmando que nossa democracia sobreviveu ao fascismo e aos atos golpistas, e nossa Constituição prevaleceu.
Como disse Ulysses Guimarães: “Discordar, sim. Divergir, sim. Descumprir, jamais. Afrontá-la, nunca. Traidor da Constituição é traidor da pátria.”
Wagner Rubinelli é professor de Direito Constitucional e pós-graduado em Direito Eleitoral pela Escola Paulista da Magistratura de São Paulo.