Outro dia li uma frase que dizia: “Até o rio tem limite”. Os animais, embora sejam irracionais, agem por instinto, têm inteligência e sabem quando estão errados, se chateiam com as broncas, mas não sentem raiva do dono por isso, continuam amando e esquecem em seguida o que aconteceu, e aprendem o seu limite. Por que então o ser humano, criado com inteligência e racional, não aprende seu limite? A sua superioridade o faz considerar esperto demais, ou tão covarde que foge dos seus próprios erros como um animal irracional fugindo de uma predação.
É para se pensar nessa racionalidade que se acredita ter, parece mais uma criança desobediente do que um adulto. Não tem limites, mas exige limite do outro, não controla sua própria vida, mas quer controlar a do outro, não dá conta da responsabilidade adulta e quer que o outro seja totalmente responsável por sua vida, erra o tempo todo, mas a culpa é sempre do outro. Esse é o narcisista, que acha que tem tudo na mão, mas, na verdade, não tem nada, vive de jogo, afeta o mental do parceiro(a) para sair bem das burrices que comete. Enquanto a vítima acha que está com problema, ou que está errada, é o abuso psicológico começando a dar os primeiros sinais, mas que normalmente a pessoa não percebe. Esse é o perigo.
Dificilmente nessa fase se percebe a dimensão do abuso que está sofrendo, a sua psiquê é tão afetada que a dúvida começa na sua cabeça, o outro está sempre com a razão. Te repreende por tudo, chantageia, faz pouco caso na frente dos outros, arruma uma atitude banal sua para mostrar que tem razão, é uma pessoa adorável socialmente, mas detestável como parceiro. E quem vai acreditar? Quando esse abuso passar a ser visto, a deixar marcas. Caí da escada, bateu a cabeça no armário, não sabe que mancha roxa é aquela, e por aí vai.
Nem sempre se há tempo para consertar o erro, antes achava que era amor, de repente está afastada da família, sua aparência, seu sorriso já não são mais iguais, e os problemas começam a surgir. O medo toma conta e, quando percebe, está somente obedecendo quem te usa, fazendo seu joguinho psicológico, mas quem está dentro não enxerga. Nem tudo é perfeito, nem tudo dá certo, um dia a casa cai.
Por que é tão difícil uma mulher entender que está vivendo uma relação abusiva? O autor escolhe sua vítima porque viu alguma fragilidade emocional em você, como medo de ficar sozinha, romântica demais, cede demais. Nenhuma relação tem só um lado, quando há amor de verdade os dois cedem, os dois relevam, senão não há relação que sustente.
Tudo tem limite, se o seu relacionamento chegou nisso ou está começando assim, preste atenção, a paixão um dia acaba, mas o abuso não. Eles dão sinais, não se iluda com alguém muito especial, logo a máscara cai, e o que era especial vira um filme de horror. Não acredite em mudanças, em lágrimas de crocodilo, é cena para mexer com seus sentimentos, não vai mudar, depois de um tempo só piora. Não existe conto de fadas, existe a dura realidade do machismo disfarçado de delicadeza.
As fases para se chegar no feminicídio são muitas, mas visíveis. Ninguém começa uma relação agredindo fisicamente, primeiro é o psicológico, moral, sexual, parental, patrimonial até chegar ao feminicídio. Procure ajude se precisar, existem casas de acolhimento às mulheres vítimas de agressão. Não se cale, sua vida vale mais.
Abaixo deixo alguns telefones de emergência. Abuso é crime.
Número 180 – Central exclusiva que presta atendimento à mulher. A vítima registra a denúncia, recebe orientações e informações sobre leis e campanhas. A ligação é gratuita, funciona 24 horas todos os dias da semana.
Número 181 – É o número de apoio para denunciar de forma anônima o abuso sexual.
Número 190 – É p número da Polícia Militar, que pode ser conectado nos casos de flagrante ou quando o abuso sexual está ocorrendo naquele momento.
Também pode registrar a ocorrência nas DEAM (Delegacias Especiais de Atendimento à Mulher). Funciona 24 horas.
* Casas-Abrigo: oferecem local protegido e atendimento integral (psicossocial e jurídico) a mulheres em situação de violência doméstica (acompanhadas ou não de filhos) sob risco de morte. Elas podem permanecer nos abrigos de 90 a 180 dias.
* Casa da Mulher Brasileira: integra, no mesmo espaço, serviços especializados para os mais diversos tipos de violência contra as mulheres: acolhimento e triagem; apoio psicossocial; delegacia; juizado; Ministério Público, Defensoria Pública; promoção de autonomia econômica; cuidado das crianças – brinquedoteca; alojamento de passagem e central de transportes.
* Centros de Referência de Atendimento à Mulher: fazem acolhimento, acompanhamento psicológico e social e prestam orientação jurídica às mulheres em situação de violência.
* Órgãos da Defensoria Pública: prestam assistência jurídica integral e gratuita à população desprovida de recursos para pagar honorários de advogado e os custos de uma solicitação ou defesa em processo judicial, extrajudicial, ou de um aconselhamento jurídico.
Procure na sua cidade ou região.
