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Justiça anula extinção da Fundação Criança em São Bernardo e determina reestruturação

Sentença considera inconstitucional a lei aprovada em 2020, durante a gestão do ex-prefeito Orlando Morando, e obriga o município a reativar a entidade voltada à proteção da infância

A Justiça de São Paulo declarou a nulidade da Lei Municipal nº 6.940/2020, que havia determinado a extinção da Fundação Criança de São Bernardo do Campo, entidade pública voltada à promoção dos direitos de crianças e adolescentes. A sentença, assinada pela juíza de direito Isabelle Ibrahim Brito, foi proferida no último dia 1º de julho e determina que o município apresente, em até seis meses, um plano para recriar a fundação, com retomada de programas, serviços e estrutura funcional.

A medida foi fruto de uma ação popular movida por dois cidadãos, que apontaram diversas irregularidades no processo legislativo que resultou na extinção da entidade, ainda durante o mandato do ex-prefeito Orlando Morando, atualmente secretário de Segurança da cidade de São Paulo.

A juíza reconheceu que houve vícios formais e materiais, como a ausência de audiências públicas, a falta de pareceres técnicos fundamentados e a omissão da consulta obrigatória ao CMDCA – Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente.

Além disso, segundo a decisão, a proposta de extinção da Fundação Criança tramitou e foi aprovada pela Câmara em apenas um dia, sem qualquer estudo prévio sobre os impactos sociais, administrativos ou financeiros da medida. Ainda mais grave, a Justiça aponta que o CMDCA sequer foi oficialmente informado da iniciativa, vindo a tomar conhecimento apenas após a publicação da lei no jornal oficial do município.

A sentença enfatiza que a Fundação Criança desempenhava papel estratégico na execução de políticas públicas essenciais para o atendimento de crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade. Em 2019, por exemplo, foram registrados mais de 115 mil atendimentos, conforme relatório anexado ao processo. Programas socioeducativos, formação profissional, atendimento a famílias em risco social e articulação de políticas públicas estavam entre as principais frentes de atuação da entidade.

Nesse sentido, a magistrada afirmou que a extinção da fundação desrespeitou o princípio constitucional da prioridade absoluta dos direitos da criança e do adolescente, previsto no artigo 227 da Constituição Federal. Do mesmo modo, apontou violação ao artigo 88 do ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente, que exige a atuação conjunta entre governo e sociedade civil na definição de políticas para o setor.

Apesar da alegação da gestão à época de que os serviços seriam absorvidos pela Secretaria de Assistência Social, a sentença destaca que não houve qualquer plano técnico apresentado antes da aprovação da lei. Em outras palavras, a decisão do Executivo — referendada pelo Legislativo municipal — ocorreu sem diálogo, sem transparência e sem respaldo técnico.

O Tribunal de Justiça já havia se manifestado anteriormente no mesmo sentido, tanto no julgamento de um incidente de arguição de inconstitucionalidade, quanto em uma ADI – ação direta de inconstitucionalidade. Em ambos os casos, os desembargadores consideraram a lei inconstitucional, com trânsito em julgado da ADI no dia 18 de outubro de 2022.

A sentença de primeira instância agora confirma essas decisões e impõe ao município de São Bernardo a obrigação de elaborar, no prazo de seis meses, um Plano de Reestruturação da Fundação Criança, que deverá ser homologado pela Justiça. Esse plano terá de incluir o retorno do patrimônio da fundação, a recomposição do quadro de funcionários e a retomada dos programas interrompidos. Além disso, o processo deverá contar com a participação do Ministério Público, do CMDCA e da sociedade civil organizada, por meio de audiências públicas.

 

POSICIONAMENTOS

 

A reportagem questionou a Prefeitura de São Bernardo sobre as providências que serão adotadas diante da sentença. Em nota, o governo municipal respondeu:

“A Prefeitura de São Bernardo, por meio da Procuradoria Geral do Município, informa que ainda não foi notificada da decisão, mas ressalta que decisões em primeira instância para esse caso, por força de ordem judicial do STF – Supremo Tribunal Federal, seguem sem efeito até o trânsito em julgado.”

Já o presidente da Câmara Municipal, vereador Danilo Lima, foi procurado, mas não respondeu até o fechamento desta edição.

 

MARCOS FIDELIS

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