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São Caetano é campeã em empobrecimento na década

Cidade está na "UTI econômica há muito tempo", diz o jornalista Daniel Lima - editor do Capital Social

DANIEL LIMA

São Caetano está virando um Grande ABC decadente. Consagrado pela qualidade de vida e mobilidade social, o Município está se tornando socioeconomicamente imagem do Grande ABC. A região foi abatida ao longo de décadas pela negligência de gestores públicos, baixa competência de instituições privadas e sociais e descarrilamento do setor industrial. Etapa que São Caetano cumpre à risca.

 

Esse é apenas um resumo do aniquilamento gradual da economia com reflexos sociais desanimadores. Tudo antes da chegada do vírus chinês. Imagine na sequência que virá.

 

Resultado de tudo isso? Na última década, o PIB do Consumo per capita (oficialmente na nomenclatura técnica chamado de potencial de consumo) impôs derrotas suplementares a São Caetano, endereço da região que mais se empobreceu. E bote empobrecimento aí. A situação é gravíssima.

 

Quem coloca na cabeça recheada de comodismo e fraqueza, quando não de covardia e oportunismo, que bato na tecla de que o Clube dos Prefeitos é uma lástima para cuidar da regionalidade, deveria sair do casulo da inoperância.

 

Esta é a primeira de uma nova série de análises que abordará o comportamento na última década do PIB do Consumo do Grande ABC e de territórios do Clube dos Municípios Mais Ricos do Estado, o G-22.
Sugiro que se previnam com analgésico. Sobretudo os tomadores de decisões em São Caetano. Para não tornar a nova exposição de dados convite à depressão, vou dosar as análises em datas aleatórias. Serão palmadas nos fundilhos, por assim dizer.

 

O PIB do Consumo do Grande ABC desabou na última década e só não apresentou resultados ainda piores porque os municípios menos tradicionais escaparam dos estragos contando com forte aporte do Bolsa Família.

 

O resultado agrava o ritual de décadas anteriores. Desde 1990 acompanhamos a toada desse indicador, parente próximo do PIB Convencional. O que separa um do outro é que o PIB do Consumo decorre do acumulado de riqueza individual e familiar de cada Município ao longo de temporadas. O PIB Convencional é resultado da geração de riqueza a cada temporada. O primeiro é um transatlântico. O segundo é uma disputa de Fórmula-1.

 

O Grande ABC perde sistematicamente nos dois indicadores. O PIB do Consumo é publicado anualmente pela Consultoria IPC, do pesquisador Marcos Pazzini. “Potencial de consumo” é a identidade dos estudos. O PIB Convencional, do IBGE, chega sempre com dois anos de atraso.
Para conhecer o PIB Convencional é sempre interessante ficar de olho no PIB do Consumo. São dois anos de defasagem que podem ser eliminados ou referenciados.

 

Os novos números do PIB do Consumo são catastróficos. São Caetano puxa a fila de infortúnios. Os três principais municípios da região perderam espaço interno e externo. Entretanto, a situação de São Caetano é demais preocupante: houve queda por habitante de 45,45% entre janeiro de 2011 e dezembro deste ano. Mais de quatro vezes a média do prejuízo do Grande ABC como um todo. Ou seja: São Caetano é um caso especialíssimo de empobrecimento contínuo.

 

Há várias explicações para o desabamento de São Caetano no PIB de Consumo. A desindustrialização acentuada neste século, uma realidade que já calculamos, está entre os pontos principais. Milhares de empregos foram decepados num setor que perde viscosidade a cada nova temporada. Já mostramos números estarrecedores em outros textos. Vamos relembrá-los nesta série.

 

O envelhecimento da população, ocupante da maior faixa etária regional, também pesa. O assalariamento de aposentados e pensionistas em geral não obedece a sincronia de vencimentos na ativa. São Caetano conta com um quarto da população acima de 60 anos. Praticamente o dobro da média regional.

 

São Caetano está na UTI econômica há muito tempo, juntamente com Santo André e São Bernardo, endereços mais significativos da região. Mas o estado vegetativo do PIB do Consumo ultrapassa todos os limites do razoável. É um caso caótico.

 

Tomara que os acadêmicos e a direção da USCS (Universidade Municipal de São Caetano) prestem mais atenção à geografia do Município em vez de vender o marketing de que pretende corrigir as mazelas do Grande ABC, como se anunciou ainda outro dia.

 

Quem não tem competência para enxergar a degringolada no próprio quintal (e já tratamos disso em várias análises) não poderia avocar para si transformações nos quintais alheios. Só mesmo o Clube dos Prefeitos permite tamanha barbaridade. O Grande ABC requer tratamento de choque econômico. Isso é tarefa para consultoria especializada em competitividade. E não existe nada semelhante em território regional. Ou faltam opções ou as opções disponíveis podem ser sequestradas politicamente.

 

É um acinte nenhum dos professores da USCS com variados títulos ainda não se ter debruçado para desembrulhar o pacote de fragilidades de São Caetano. E que a instituição propague expansão regional em parceria com o inútil Clube dos Prefeitos.

 

A derrocada de São Caetano na última década no PIB de Consumo foi tão dramática que repeti várias vezes operações matemáticas para me certificar de que não havia equívoco. Solicitei até ajuda extra.

Para que São Caetano mantivesse intocável o poderio de consumo per capita registrado em 2010 (base de comparação da década), seria necessário que atingisse R$ 45.396,09 mil. O resultado decorreria do PIB de consumo per capita de 2010 (R$ 27.209,36) corrigido pela inflação do período: foram estimados 66,84% de IPCA nas 10 temporadas, mas, conforme previsão do Banco Central, a inflação desta temporada poderá elevar o total a 69,14%.

 

Atualizados os valores por 66,84% de inflação acumulada, o PIB per capita de consumo de São Caetano chegaria, portanto, a R$ 45.396,09. Entretanto, como só alcançou R$ 31.209.130, a diferença corresponde a 45,45% do valor original corrigido pela inflação. Não custa repetir que se trata de resultado por habitante, melhor métrica porque estabelece juízo matemático mais consistente de comportamento econômico em várias situações.

 

Não há nenhum Município do Grande ABC que acusou golpe tão profundo. São Bernardo foi quem mais se aproximou, com queda acumulada no período de 30,15% por habitante. Eram R$ 19.957,19 em 2010 e passou para R$ 25.581,86. Aplicando-se a inflação do período, o valor referente a 2010 chega a R$ 33.296,58. Daí a diferença de 30,15%.

 

Santo André também passou por revés com a perda acumulada de 14,74% na década que se completa neste 2020. Eram R$ 19.191,57 de PIB de consumo em 2010 e passou para R$ 27.904,25 neste ano. Com a inflação, deveria ter alcançado R$ 32.019,21 para não sofrer perda.

 

Os demais municípios do Grande ABC, de menor peso, registraram aumentos efetivos do PIB de consumo na década: Diadema (17,64%), Mauá (16,01%), Ribeirão Pires (15,43%) e Rio Grande da Serra (11,49%).

 

A explicação mais plausível é que a distribuição do Bolsa Família colaborou intensamente. Entretanto, como o peso relativo de Santo André, São Bernardo e São Caetano é muito maior (60% da população regional), o resultado final da década foi negativo para o conjunto dos sete municípios, com perda acumulada de 11,12%.

 

O PIB por habitante do Grande ABC em 2010 registrava R$ 17.549,59. Com a inflação do período, deveria ter chegado a R$ 29.349,29 em 2020. Mas só alcançou R$ 26.349,29. Daí a perda de 11,12%.

 

A temperatura do PIB do Consumo per capita do Grande ABC na década de 2011-2020 correu muito abaixo da média brasileira. No conjunto dos municípios do País houve crescimento de 9,50%. Ou seja: o Grande ABC correu em raia distinta do País: enquanto perdia mais de 11% de poder de consumo, a média nacional avançava quase 10%.

 

Não é por outra razão que a participação relativa do PIB de consumo do Grande ABC perde fôlego no País. Cada vez mais o Grande ABC é menos importante relativamente ao País quando se trata de observar o grau de riqueza individual (e também do conjunto) doso moradores.

 

Em 2010 o PIB de Consumo do Grande ABC representava 2,03202% do País. Já neste 2020 não passa de 1,65671%. Uma perda de participação relativa de 22,65%%.

 

O rebaixamento do PIB do Consumo per capita de São Caetano compromete a liderança regional que detém desde o século passado como símbolo de Município cuja qualidade de vida está bem acima da vizinhança e é uma quase exceção à região na maior metrópole da América Latina.

Somente considerando os resultados da última década deste século, São Caetano viu sua participação relativa na região sofrer abalo quando se considera o PIB de Consumo por habitante.

 

Em 2010, o PIB do Consumo nominal (sem considerar a inflação) por habitante de São Caetano era de 27.209,36, ante R$ 16.771,56 do Grande ABC como um todo. Uma vantagem de 38,36%. Neste 2020, o PIB do Consumo por habitante de São Caetano é de R$ 31.209,13, enquanto na região é de é de R$ 26.349,29. A vantagem foi reduzida a 15,57%. Ou seja: a distância caiu em 59,41%. Esse resultado significa a média anual de estreitamento de 5,941%.

 

A seguir nessa toada, haverá empate técnico do PIB de Consumo entre São Caetano e a média dos demais municípios em três anos. Algo impensável há duas décadas.

 

Já não é tão extravagante a distância que separa classes socioeconômicas em São Caetano e a média do Grande ABC. Entre as famílias ricas, São Caetano conta com 6,6% dos moradores, enquanto a média do Grande ABC é de 3,1%. Mais que o dobro. As famílias de pobres e miseráveis representam 16,8% da população de São Caetano, ante 19,8% do Grande ABC. Em 2010 eram 8,4% em São Caetano e 12,6% no Grande ABC.

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